Grande Mocinha
Luciana viu a casa ficar cada vez
mais apertada, com pessoas estranhas entrando e andando e conversando. Ela não
devia chamar eles de “estranhos”, sabia disso, pois eram da sua família. Mas
era uma família tão grande! Grande demais para a pequena casa de praia, onde
sempre se juntavam para passar o natal, e Luciana ganhava um monte de
presentes. Eles gostavam dela. Diziam que ela era linda, e muito esperta. Mas
ficavam incomodando ela após dizer isso, mexendo em seu cabelo, fazendo
perguntas. Antes ela chorava, mas agora não. Mamãe disse “você já é uma mocinha
agora, e é muito feio uma mocinha chorar”.
E lá estavam os primos. Luciana
sempre quis brincar com eles, mas nunca a deixavam. Desta vez, tentou chegar
perto sem ser notada, para ouvir que diziam. Teve a impressão de que perceberam
que ela estava ali, mas não se importaram.
– Então, tu acha que vai
acontecer mesmo? –
– Olha cara, na real, eu não acredito nisso –
– Então tu não ta com medo? Nem um pouco? –
– Eu to com medo. O negócio é sexta, e já é quarta-feira hoje –
– Olha cara, na real, eu não acredito nisso –
– Então tu não ta com medo? Nem um pouco? –
– Eu to com medo. O negócio é sexta, e já é quarta-feira hoje –
Eram quatro primos. Todos mais velhos que Luciana, e
todos grandes. Viviam tirando sarro dela, fazendo brincadeiras, dando sustos.
Mamãe não gostava deles.
– Por que você acha que
tem bem mais gente aqui agora? A família toda se reuniu pra passar o fim do
mundo juntos –
– Eu não quero passar meus últimos dias com vocês –
– Até parece, vai passar onde então? Vai fugir de casa? –
– Não, eu... –
– Há! Ele não tem coragem nem pra isso –
– Eu tenho sim! Só não faço porque sei que o mundo não vai acabar –
– Medrosinho, ta com medo de morrer –
– É cara, ta com medinho porque sabe que vai morrer –
– Todo mundo aqui vai morrer, e vai ser todo mundo junto nessa casa –
– Eu não quero passar meus últimos dias com vocês –
– Até parece, vai passar onde então? Vai fugir de casa? –
– Não, eu... –
– Há! Ele não tem coragem nem pra isso –
– Eu tenho sim! Só não faço porque sei que o mundo não vai acabar –
– Medrosinho, ta com medo de morrer –
– É cara, ta com medinho porque sabe que vai morrer –
– Todo mundo aqui vai morrer, e vai ser todo mundo junto nessa casa –
Luciana soluçou. Eles então perceberam que ela estava
prestando atenção. O primo mais novo, que estava sendo acuado pelos outros, os
enfrentou.
– Viu o que vocês
fizeram? –
Ele falou um pouco alto demais. Os adultos em volta se
viraram para olhar, e todos viram que ela tinha lágrimas nos olhos. Mas ela não
podia chorar, era uma mocinha agora. É feio uma mocinha chorar.
– O que foi, Lu? –
– Lu, o que eles fizeram? –
– Por que você está chorando? –
– Lu, o que eles fizeram? –
– Por que você está chorando? –
Todos se aproximaram dela, fechando um círculo. Ela agora
começava a se desesperar. Queria gritar que não estava chorando, mas não
conseguiu. Aí sim começou a chorar, e saiu correndo pelo meio daquela família
de estranhos. Foi para a varanda, onde esperava encontrar a mãe. Esta estava
sentada, conversando e rindo, mas parou para abraçar a filha e pô-la no colo.
– O que foi, Lu? O que
aconteceu?
Luciana não responde. Ainda soluçava, e se arrependia
tanto de ter começado a chorar. Será que não era mais uma mocinha?
– Calma, meu amor. Vai
ficar tudo bem. Mamãe está aqui, então vai ficar tudo bem –
Luciana respirou, e se agarrou mais forte ao abraço da
mãe. Ia ficar tudo bem, sim. Mamãe nunca mentia, então ia ficar tudo bem, e
nada de mal iria acontecer.
Muito legal Téo! Parabéns! Adoro seus contos!
ResponderExcluirMuito obrigado! Fico feliz de ver que você continua lendo
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